Diálogos com a Pedagogia Freinet: fundamentos e práticas em movimento

Organização: Adriana Pastorello Buim Arena, Valéria Aparecida Dias Lacerda de Resende

APRESENTAÇÃO

No movimento de pesquisas e de estudos ocorridos no contexto do projeto trienal Pedagogia Freinet: os princípios da escola moderna para o ensino do século XXI, o grupo Lecturi dá os contornos finais às palavras de professoras – que na luta diária por abrir as portas da sala de aula para a vida, buscam uma escola melhor para as crianças – e publica, com entusiasmo, o segundo livro decorrente desse desejo latente de transformar a educação e a sociedade com os homens de amanhã.

Diálogos com a pedagogia Freinet: fundamentos e práticas em movimento tem como objetivo apresentar algumas propostas pedagógicas que se realizaram em salas de aula brasileiras à luz das técnicas de trabalho que Freinet utilizou em sua sala de aula, no contexto francês. Como lanterna que guiará o foco da leitura, faz-se necessário retomar o conceito de método natural e o de técnicas de trabalho pedagógico.

Primeiramente, é preciso destacar alguns preconceitos e usos que academicamente foram criados em relação ao termo técnica, que revelam modelos e concepções epistemológicas de ciência e que repercutem no campo educacional. Por um lado, há um entendimento que a técnica e seu emprego são quase como um vírus da Covid-19 que precisa ser evitado a todo custo, pois o uso da palavra pode ser mal compreendido e sua materialidade taxada de práticas tecnicistas, que mantem o fazer pedagógico circunstanciado a um executar sem reflexão, bem adestrado e administrado. Para distanciar-se desse contágio, muitos professores assumem posturas espontaneístas e assistemáticas, negando a reflexão contínua do fazer pedagógico.

Um segundo modo de entender a técnica é por meio de seu uso ‘puro’, eficiente, eficaz e competente frente à matéria prima que recebemos – a criança – para transformar em produto manufaturado de primeira qualidade para o sistema neoliberal que organiza a distribuição da riqueza no mundo. Esse entendimento é respaldado pela epistemologia da prática e pelo discurso que a teoria é apenas um discurso, distante da realidade.

Assim, muitos de nós temos medo e evitamos usar a palavra técnica para que o relato de nossa práxis não seja entendido como um grosseiro conjunto de procedimentos a ser seguido, sem qualquer alteração. Seguramente, a palavra técnica empregada neste livro não está nessa esfera de compreensão e avisamos que será usada assim como a concebia Freinet, ou seja, as técnicas, os princípios e os instrumentos são solidários, indissociáveis e relacionados dialeticamente, o que implica dizer que não há prática neutra, espontaneísta, e sim, um trabalho forjado no materialismo escolar e na luta vivida cotidianamente em cada sala de aula das autoras.

Compreendemos que método e técnica são conceitos diferentes tanto na pedagogia Freinet como fora dela. O termo método natural foi utilizado por Freinet para fazer oposição a todos os métodos tradicionais de sua época. Para melhor recuperação do conceito, indicamos a leitura do capítulo Freinet e o método natural: da simplificação conceitual ao entendimento epistemológico publicado no livro Por uma pedagogia Freinet: bases epistemológicas e metodológicas. Por hora, ficamos com a redução da explicação: o método natural é um conjunto de princípios filosóficos, psicológicos e pedagógicos que rege toda e qualquer ação pedagógica.

É preciso conhecer o pensamento de Freinet, para entender que o método natural não é uma receita de passo a passo, que o professor pode aplicar em qualquer lugar da mesma forma, mas princípios teórico-metodológicos para a educação. Portanto, utilizaremos a palavra técnica no estreito laço com os princípios do método natural: ela é a via de materialização dos princípios proclamados pelo método natural, é a manifestação concreta – material – de um pensamento – imaterial – que ganha forma e vida com o trabalho. É pela técnica que se pode chegar à operacionalização das ideias defendidas no complexo método natural. As técnicas também não têm uma receita rígida, porque os meios de produção mudam ao longo do tempo, então, o que nos permite, assim como fez Freinet de também chamá-las de instrumentos. Tomemos como exemplo a técnica – ou o instrumento – texto livre. Ele não tem que ser produzido obrigatoriamente no papel com a periodicidade inflexível de todos os dias da semana, mas pode ser acordado com o grupo-classe a quantidade de vezes que ele entrará em roda ao longo de uma semana ou uma quinzena, o suporte, ou melhor, em quais suportes ele será inscrito. O que não muda é sua natureza a serviço dos princípios do método natural: o instrumento ou técnica texto livre é o espaço da vez e da voz da criança e é com a necessidade de produzir na linguagem escrita seus enunciados que ela vai aprender a escrever sem os manuais didáticos tradicionais.

Essa breve explicação tem como propósito explicitar que a técnica freinetiana está encharcada e é movida por seus princípios. E aqui, neste livro, as técnicas precisam ser entendidas nesse contexto, porque foi nele que os relatos se construíram.

Em cada capítulo encontraremos o uso de técnicas freinetianas adaptadas ao tempo e ao espaço em que foram utilizadas na busca constante de cada autora de restituir à educação seu lugar na Vida para minimizar os problemas de desigualdades e de injustiças que atravessam a história da educação pública brasileira.

Esperamos que você, caro leitor, encontre neste livro, uma possibilidade de diálogo e inspiração para reencontrar as linhas do compromisso ético e político da nossa profissão docente.

Adriana Pastorello Buim Arena
Valéria Aparecida Dias Lacerda de Resende

Líderes do grupo Lecturi

Ano de lançamento

2022

Formato

ISBN

978-65-5869-865-4

ISBN [e-book]

978-65-5869-866-1

Número de páginas

307

Organização

Adriana Pastorello Buim Arena, Valéria Aparecida Dias Lacerda de Resende