Esse é nosso Caderno de Estudos de número 14. Desde 2008 que nosso Grupo publica Cadernos de Estudos a respeito de questões emanadas dos estudos que fazemos juntos, no decorrer do ano em curso, de Bakhtin e do Círculo Bakhtiniano.
Nos estudos desse ano nos voltamos a um tema já visitado várias vezes, e de vários jeitos, que é a questão de estabelecer a crítica do mesmo, do reiterável, da repetição, do eco, da palavra neutra, do monologismo, do individualismo. Para embasar as conversas dos amigos do Círculo Bakhtiniano, o individualismo sempre era colocado e foi tratado como o erro fundante, o proton pseudos, a
primeira mentira.
Onde há o individualismo não há vozes, não há relações dialógicas, não há interações, não há o novo, não há
memória de futuro, não há o por-vir. Onde há o individualismo há somente o Eu no centro de valor. Todo o resto é objeto, tudo é objetificado, funcionalizado, posto a meu serviço. Isso é possível? Sim, é assim que vivemos desde há muito tempo. E sendo assim, apenas meus valores é que valem, apenas o que eu penso é que vale, e uma única voz diz os sentidos, a minha voz. E onde há uma
única voz que está no centro, tudo fica enfeixado, é o fascismo. Então diante dos diferentes eu fico indiferente, não ligo, não me importo, não me coloco na escuta. Ajudantes do fascismo são as perspectivas abstratas, as ideias universalizantes, a ideologia do apagamento e do velamento, que disfarça, esconde, ludibria, mistura interesses contraditórios, mente descaradamente.
Precisamos decifrar essa esfinge contemporânea, ou o individualismo vai continuar nos devorando. Os grupos dominantes vão continuar criando e impingindo nos dominados a sua sombra, seu universo de escravidão, racista, preconceituoso, indiferente, lesivo. E cantam seus cantos que encantam, quais sereias encantadoras. A única realidade que interessa a eles é o dinheiro, a fortuna, o luxo e a desigualdade. E assim o ideal de humano das classes dominadas passa a ser o humano dominador. Nessa direção nos empurram as igrejas, as instituições, os pais, os endinheirados, os cooptados. Os barqueiros de Ulisses tiveram seus ouvidos fechados com cera no sentido de não escutar essas vozes melífluas e assassinas; e o próprio Ulisses precisou ser amarrado no mastro pra poder escutar, mas ser impedido de se jogar nessas águas mortíferas. É preciso construir as contenções e as barreiras contra as ilusões, as mentiras, as falsas promessas, os usos dos deuses, a compra das consciências.
[…]
Desde as montanhas de Teresópolis,
aos 13 de novembro de 2022.
Pensando nos periscópios do Augusto e do Geraldi.
